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9 anos agoon
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Um aviso incomum sobre a obra mais recente do diretor Luis Estrada, o aguardado filme, A Ditadura Perfeita, precede essas cenas: “Nesta história todos os nomes são fictícios, porém os eventos são verossímeis. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência”.
Tem o presidente jovem e bonito, que diz coisas estúpidas. Há também o governador corrupto que aceita uma mala cheia de dinheiro em seu escritório.
E existe a rede de televisão gigantesca que, por uma bolada, impulsiona um candidato à presidência pouco conhecido através de um sistema de limpeza de imagem cuidadosamente elaborada, que inclui associá-lo a sua estrela mais atraente.
Os mexicanos que assistirem ao filme passarão por uma sensação de déjà-vu, como, de fato, a maior parte dele foi inspirado em escândalos que dominaram as páginas de jornais e noticiários de televisão nos últimos anos.
Em uma reviravolta que poderia facilmente ter sido parte do filme de Estrada, cujo tema é a influência indevida forjada pela mídia, o braço cinematográfico da maior empresa de transmissão do México, a Televisa.
Estrada, que foi obrigado por contrato a pagar de volta o dinheiro que a Televisa inicialmente investiu na distribuição – tanto Estrada quanto a Televisa se recusaram a dizer o valor, citando confidencialidade – se esforçou para chegar a um plano B: o filme agora será co-distribuído pela sua empresa, a Bandidos Films, e a Alfhaville Cinema, uma pequena empresa de distribuição.
O filme deve estrear em outubro, diz um aviso no trailer. O título: A Ditadura Perfeita, é uma referência à descrição do escritor peruano, Mario Vargas Llosa, do partido político dominante do México, o Partido Revolucionário Institucional, ou PRI.
“A ditadura perfeita não é o comunismo, não é a União Soviética, não é Fidel Castro, é o México”, disse Vargas Llosa, durante uma conferência em 1990.
“É uma ditadura camuflada de uma maneira que faz parecer que não é, mas tem todas as características de uma ditadura: a permanência, não de um homem, mas de um partido político”, completa Vargas.
O PRI está no poder de forma ininterrupta através de uma mistura de despotismo e oligarquismo em uma relação simbiótica com a Televisa há 71 anos, até que foi expulso pelos eleitores em 2000.
Após a eleição de Enrique Peña Nieto, o PRI recuperou a presidência em 2012, que inspirou Estrada a escrever o roteiro para a ditadura perfeita, originalmente intitulado A Verdade Suspeita.
Não é nenhuma surpresa que o diretor que assumiu este tema seja o Estrada, que é conhecido por suas destemidas e ácidas sátiras, as quais denunciam a marca particular da corrupção do México, além da violência e da desigualdade social.
Estrada não é “apenas o diretor mais ambicioso do México, mas o melhor… Ele é o diretor que procura os temas difíceis e que trata desses temas de forma estridente”, diz José Felipe Coria, diretor do Centro de Estudos Cinematográficos do México da Universidade Nacional Autônoma.
O filme começa com uma reunião entre o embaixador dos EUA e o presidente mexicano. Este último, que se esforça para se comunicar em Inglês, pretende transmitir uma mensagem importante para o presidente norte-americano: Diga a ele que o meu povo está disposto a fazer todos os trabalhos sujos que nem os negros querem fazer.
Em poucos segundos, as mídias sociais explodem com as hashtags #NotEvenTheBlacks. “Nós realmente erramos ao colocar esse desgraçado em Los Pinos”, diz o diretor da empresa fictícia de televisão, referindo-se ao equivalente da Casa Branca do México.
Peña Nieto, por sua vez, cometeu erros semelhantes que se tornaram virais, incluindo momentos em que ele não foi capaz de citar três livros que o influenciaram muito ou de recordar o preço das tortillas, um alimento básico no México, porque “ele não é uma dona de casa”.
Um funcionário do escritório do porta-voz do presidente disse que o departamento não iria discutir o filme e que sua equipe não assistiu, mas acrescentou: “A Presidência da República é muito respeitosa com todas as expressões artísticas e culturais”.
“Eu acredito que conheço o sistema político mexicano e seus personagens muito bem”, diz Estrada. Ele lê cerca de cinco jornais todas as manhãs, uma rotina que o ajudou a criar o enredo do filme e seus protagonistas, particularmente Carmelo Vargas, o corrupto e carismático governador no centro da história. “Ele é uma soma de todos esses personagens antigos, chamados dinossauros, desde os tempos do PRI”, diz Estrada.
“A televisão já escolheu um presidente. Será que vai fazê-lo novamente?”, pergunta o filme.
Durante sua primeira semana, o trailer do filme recebeu 1,2 milhões de visualizações no YouTube e um comentarista escreveu: “Tão real que parece ficção”. O comentário recebeu mais de 11 mil likes em sua página no Facebook e 3 mil seguidores no Twitter. O filme passará em 1.200 cinemas, aproximadamente.
A Academia Mexicana de Artes e Ciências Cinematográficas anunciou no final de agosto que o filme havia sido pré-selecionado para representar o México no Oscar 2015.
Poderia ser o final perfeito.
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