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O Brasil vive um momento peculiar em vários setores da indústria com as atenções voltadas para o país, principalmente, por ter sido a sede da Copa do Mundo e em função das eleições presidenciais que acontecerão em outubro próximo. Com um cenário econômico de incerteza e fragilidade, investidores se sentem cautelosos em apostar suas fichas aqui e o momento agora é de atenção por parte dos gestores. Somam-se a isso, as características do mercado como burocracia e complexidade tributária, que deixaram o país menos competitivo e pouco atraente para novos investimentos.
O que notamos é que a indústria brasileira já começou a sentir os efeitos desse cenário e o agronegócio é um deles. Em uma pesquisa realizada pela KPMG durante um evento sobre gestão e recuperação de ativos e investimentos, que reuniu executivos de instituições financeiras, investidores e empresários, o segmento é apontado como um dos que mais podem ser afetados, o que deve demandar um esforço adicional na reestruturação dos negócios, principalmente, no que diz respeito à adequação da estrutura de capital para diminuição do grau de alavancagem e na redução de custos. Além do agronegócio, foram citados também as áreas imobiliária, de construção civil, energia, montadoras e autopeças.
Ainda de acordo com o levantamento, há uma possibilidade real de aumento no número de pedidos de recuperação judicial nestes setores. Para se ter uma ideia, somente no ano passado, foram feitos 874 pedidos neste sentido, um recorde maior que o registrado em 2009, momento pós-crise mundial e que gerou 670 solicitações. A pesquisa apontou ainda o motivo do crescimento no número dessas ocorrências: para 41% dos entrevistados, o aumento e popularização da lei perante à sociedade empresarial foi o principal fator; elevação das taxas de juros e restrição de crédito para as empresas (22%) aparecem em segundo lugar, intervenção do governo sobre setores da economia (15%) em terceiro, e desaceleração da economia brasileira (13%) por último.
Já com relação ao agronegócio, os números da Única (União das Indústrias de Cana-de-açúcar) confirmam a cautela na indústria. Segundo a instituição, pelo menos 30 usinas de cana-de-açúcar estão em processo de recuperação judicial e pelo menos outras dez devem paralisar suas atividades. Além disso, esse setor tem uma preocupação maior, já que muitas empresas ainda contam com uma gestão familiar, sem uma profissionalização dos processos.
Com base nesse cenário, vale lembrar a necessidade de as empresas se preparem para evitar que uma crise se instale de maneira acentuada, de modo que não reste outra alternativa a não ser a recuperação judicial. Para isso, os gestores devem se manter alertas para alguns indícios de que a companhia pode não estar passando por uma situação confortável, tais como o alto nível de endividamento, a redução de rentabilidade, pressão no capital de giro e condição desfavorável em relação ao ano anterior. Neste caso, quanto antes for feito o diagnóstico de problemas e tomadas as providências necessárias, maiores as chances que ela tem de se reerguer.
Durante um processo de reestruturação, o primeiro passo é a realização de um diagnóstico da situação da empresa e, em seguida, é proposto um plano de estabilização e rentabilização. Paralelamente, é necessário analisar o relacionamento dela com todas as partes interessadas, como credores, departamento financeiro, Fisco e colaboradores. Vale lembrar que o fundamental para esse processo ser bem-sucedido é o acesso a crédito para financiamento de vendas e de produção; comunicação transparente e efetiva com os stakeholders envolvidos; eficiente sistema de gestão, em especial a financeira; profissionalização da gestão e melhor governança corporativa.
Diante desse contexto, empreendedores, bancos, investidores, dentre outros, devem ter uma parceria integrada, atuar em conjunto e adaptar suas práticas para, dessa forma, utilizar suas competências com o objetivo de evitar crises e manter o valor das empresas. Saber o momento de buscar uma reestruturação é essencial para a sobrevivência de uma companhia.
Por André Schwartzman, sócio da KPMG no Brasil e líder do setor de reestruturação.