
O pai do amigo
O menino chegou em casa chateado. O pai, sem saber o que tinha acontecido, sentou ele no colo pra conversar. Com os braços cruzados, o olhar emburrado, o menino resolveu se abrir.
– Pai, o pai do Marquinhos é melhor que você!
– Ah é, filho?
-É. E muito melhor.
– E apesar de eu ser esse pai horrível, posso saber o porquê?
– O pai dele tem um carro maior que o nosso.
– Sei.
– E uma casa maior que a nossa.
– Hum…
– E o Marcos vai pra Disney no final do ano e a gente não!
– Puxa vida filho, difícil competir com ele, hein?
– Eu não quero que você seja pior que ele, pai. Mas você é….
O menino saiu correndo em direção ao quarto e deitou na cama, fingindo entretido com um velho álbum de figurinhas.
Ser pior que o pai do Marquinhos não era ruim. O problema era ser pior que o pai do Marquinhos para o seu próprio filho.
Seria inútil argumentar que tudo aquilo eram bens materiais, que nada disso tinha importância, que eram apenas cifras (das grandes).
Também seria inútil mudar o tom da comparação e voltar o assunto para algo que ele pudesse vencer. Por exemplo: o pai do Marcos não tinha na família a Vó Antônia e sua torta de frango. Nem tinha feito um vulcão que soltava fumaça para a feira de ciências. Muito menos tirava da pizza do Marcos, um por um, os pedacinhos de orégano e outras verdices.
Viu que não tinha outra coisa a fazer. Pegou o telefone e fez a ligação.
– Alô. É o pai do Marquinhos? Oi Marcão, aqui é o Júlio. Tudo certo, tudo certo….
O filho, ouvindo a conversa, foi pra porta do quarto espiar o pai. Aquilo era assunto de gente grande, mas como ele que tinha começado tudo aquilo, ou já era grande o bastante pra entrar no assunto, ou o assunto se apequenou e ele já tinha tamanho pra participar.
– Marcão, é o seguinte… tô com um probleminha com o meu filho. Será que dá pra você devolver o carro que eu te emprestei? Eu sei, eu sei…. Mas é complicado. Eu também queria a casa de volta, se não for te atrapalhar. É, mesmo? Puxa vida… As passagens pra Disney também eu quero de volta, ok? Pode deixar tudo aqui de manhã e eu pego a chave com você depois. Onde você vai morar? Sei lá Marcão. Eu só tô pedindo a casa de volta por causa do meu filho. Não, não.. claro que eu não quero que você vá morar embaixo da ponte….Mas é o meu filho, você sabe..
O menino, entendendo a situação puxa a barra da camisa do pai, que diz estar ocupado. O menino insiste.
– Um segundo, Marcão…. O que foi filho?
– Pai, as coisas do pai do Marquinhos são suas?
– São sim, mas já estou pegando de volta pra você perceber que eu sou melhor que o pai dele.
– Mas eles vão morar na rua?
– Talvez filho, eles não têm casa. Eu emprestei tudo pra eles pra poderem viver com um mínimo de conforto. Mas se você quer tudo isso de volta, não tem problema.
– Não pai. Não precisa. Eu não quero que eles morem na rua. Deixa eles com tudo.
– Tá bom, espera só um pouquinho…. Marcão, resolvido. Pode ficar com tudo, não tem problema. Já acertei aqui, tá bom? Abraço.
– Pai, você é o melhor pai do mundo!
– Obrigado filho. Só não comenta com o Marquinhos. Ele não sabe de nada disso, tá bom?
Depois do abraço o menino voltou a brincar, sem aquela cara triste. O pai também. Podia não ter mais coisas que o pai do Marquinhos. Mas era imbatível na criatividade.
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Diogo Mono. Redator publicitário, tenta ser escritor, será pai de família e continua sendo um observador das coisas do cotidiano. © 2014