
Para que possamos assistir uma série de tevê de quarenta minutos, poucos dias depois de sua estréia nos Estados Unidos, é preciso o trabalho de pelo menos cinco pessoas, cada um dedicando cerca de doze horas de seu tempo para isso. De forma colaborativa e gratuita. Este é o caso da Equipe Insubs (insubs.com), responsável pela legendagem de quarenta e seis séries disponíveis para download atualmente.
“Na InSUBs temos gente com tudo que é tipo de profissão: professores, funcionários públicos, médicos, autônomos, pessoal que trabalha com marketing, designers gráficos e até tradutores profissionais”, explica PenélopeC, administradora do Insubs há três anos . “Todo mundo dedica uma parte do tempo livre para isso, mesmo sendo escasso. Temos o caso de uma tradutora que tem 3 filhos, trabalha, e ainda arruma um tempinho para ajudar em alguma série”. Segundo ela, cada um tem um motivo pessoal para legendar, “mas a maioria quer melhorar o inglês e o português também”.
A equipe conta com cerca de 200 colaboradores, espalhados pelo país. Os membros, cuja idade vai desde os 14 até os 40 anos, dividem-se entre as tarefas de administração, revisão e tradução. No caso de um revisor, esclarece PenélopeC, para uma série padrão de 40 minutos são necessárias 5 horas de trabalho, que incluem a revisão ortográfica e gramatical, verificar a tradução, pesquisar termos específicos (especialmente séries médicas e jurídicas), dar coerência a tradução, garantindo o uso dos mesmos termos em todos episódios e conferir a sincronia.
As equipes de legendagem organizam-se em um coletivo unificado, o legendas.tv (http://legendas.tv), onde concentram-se as legendas. “As equipes dizem em quais séries possuem interesse, e a administração do site pondera qual equipe seria melhor para fazer determinada série”, diz a administradora. Os critérios para distribuição entre os coletivos vão desde a qualidade de legenda, pontualidade de postagem, onde cada série tem até 7 dias para ser postada, e o “estilo” da equipe.
Para PenélopeC, o trabalho do Insubs é resultado das mudanças que a internet tem operado na forma de entretenimento. “Muitas pessoas usam as nossas legendas porque não têm dinheiro para pagar uma tv a cabo, só conseguem uma internet, muitas vezes lenta”. O surgimento da Netflix e de canais por demanda na própria tevê estimulem esta mudança. Segundo ela, “a tendência é que as pessoas fiquem menos presas ao horário da tv e mais inclinadas a curtir séries em meios alternativos”.
Por conseqüência, o modelo de publicidade também deve sofrer alterações. “Outro dia vi uma reportagem de um sueco que passa o dia todo jogando videogame, coloca os vídeos que ele faz no YouTube, e fatura o equivalente a 700 mil por mês através dos links de publicidade dos vídeos dele. Então, não é impossível”, exemplifica. Porém, exige uma forma diferenciada do molde atual de comerciais televisivos. “No caso de canais de streaming como o Netflix, o pagamento de mensalidade já cobre muita coisa, acho que muita coisa é possível, é só se pensar em formas que fujam do tradicional, mas empresas grandes sempre ficam relutantes em fazer grandes reviravoltas neste sentido”.
Gratuidade ou licenças mais amplas, acessibilidade, sem perder de vista os padrões de qualidade e colaboração são alguns dos conceitos que moldam estas transformações diárias na internet. Mas, especialmente, a internet se transforma coletivamente, com novos sujeitos como as equipes de legendagem. Um passo a frente da indústria, não é difícil prever que estes coletivos terão vida longa em e na rede.
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Miguel Stédile é zagueiro, gremista, historiador e dublê de jornalista. © 2014.