
Feriado nacional, estreia do Brasil na Copa do Mundo e a cena que ficou marcada na televisão foi um pai indo tirar, a tapas, seu filho de um protesto que acontecia antes da partida.
Os argumentos do pai eram simples: “eu te amo, cara”, “não criei você pra isso”, “vai trabalhar e quando você ganhar seu dinheiro você reclama”, e o mais interessante foi quando o menino dizia que queria mais hospitais, mais educação, e o pai explicou carinhosamente: “Eu pago escola pra você”.
Essa situação deixa duas cosias muito claras. Primeiro, a nossa incapacidade de nos colocar no lugar dos outros. O pai não estava pensando em ninguém ali, exceto nele e na família dele. Ele não se importa se existe educação, hospitais, transporte ou qualquer benefício para o resto da população, afinal, ele paga para ele e a família poderem usufruir, portanto, está tranquilo.
E esse tipo de raciocínio é que faz com que as coisas sejam difíceis na política.
Primeiro porque a política passa a interferir pouco na nossa vida quando temos dinheiro para pagar pelo que o governo não oferece. Nesse sentido, faz menos diferença para você se o metrô é bom ou ruim se você não depende deles pra se locomover. E como isso já acontece há muito tempo, já virou algo comum. Não pensamos que poderíamos economizar o que gastamos em escolas particulares se a escola pública fosse decente. Já contamos que o dinheiro da escola é um dos custos naturais de se ter um filho. E assim é com o carro, o plano de saúde, a segurança da casa, e etc. A política passa a ser secundária. E por isso a participação política perde força. Quando ele reforça que o filho deve trabalhar para depois poder reclamar, isso também é uma forma de dizer: ganhe seu dinheiro para não depender deles, filho.
É assustador.
Mas mais assustador ainda é a outra frase que ele fala para o rapaz: “você não vai mudar o mundo, filho”.
Essa é a última coisa que eu gostaria de ver ser dita a um adolescente.
A adolescência tem duas grandes virtudes: os peitos duros e a inconsequência. E inconsequência para o bem e para o mal. Seja para acreditar no impossível e achar que suas atitudes fazem diferença, seja para terem atitudes idiotas das quais eles vão se arrepender depois.
Se tirarmos isso deles, o que vai sobrar?
Essa impressão de que não somos capazes de mudar o mundo é algo que a vida vai nos contando aos poucos, dia a dia, durante o nosso amadurecimento. E aí percebemos que não somos tão poderosos quanto pensávamos e que nem sempre as coisas fazem sentido como deveriam.
Os adolescentes precisam acreditar que podem fazer o que seus pais não fizeram. Precisam acreditar que podem fazer diferença. Precisam, sobretudo, ir contra o que seus pais esperam deles, porque é isso que faz de um adolescente algo louvável.
Eu não acho que o mundo precise de adolescentes que não se achem capazes de mudá-lo.
Talvez o mundo não precise de ninguém que não se sinta capaz de mudá-lo, mas a vida nos torna assim.
Não vou falar sobre o protesto, os motivos, as pessoas com o rosto coberto nem a justa preocupação do pai com a segurança do seu filho. Embora não seja possível saber se ele era mais ameaça ou vítima.
O que fica mais marcado na situação é uma sociedade que só pensa na própria necessidade. E uma avalanche de pessoas nas redes sociais que acredita que adolescentes não servem pra nada até que comecem a trabalhar e ganhar seu dinheiro. Ou seja, até que sejam amansados pela situação e passem a não tentar mais fazer nada de diferente.
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Diogo Mono. Redator publicitário, tenta ser escritor, será pai de família e continua sendo um observador das coisas do cotidiano.
© 2014