
Agora o The São Paulo Times conta com uma coluna dedicada à poesias chamada “Poética Urbana”.
Ela será publicada toda sexta-feira. Para colaborar envie sua poesia para poesias@saopaulotimes.com.br.
Balão, balonismo, amor no infinito
(Marcelo Leandro Ribeiro)
Tomado por um sopro lá se vai o cesto
meio a contragosto, puxado pelo vento
Cesto que sozinho não decola, cesto que
se faz balão, solto pelos céus do agora
Impulsionado por sonhos e desejos
de quem de dentro vê o mundo
sendo pássaro sem asas, voando
por matas, casas, elevando seu sorriso
como quem acaba de conhecer o infinito
No cesto, sozinho, dois corpos se beijam
pouco importa onde estejam, pra onde
os guie o destino através dos ventos
No cesto, carinho, dois corpos se querem
desejam que o vento, os leve pra sempre
os leve agora, pra onde não importe
o tempo
seja sempre o agora
Vento que faceiro escolhe ser brisa ou ventania
roçar ligeiro pelos corpos que se querem, passar
por seios e alhures, verter-se junto ao ensejo dos
que nas alturas se impelem, a ser em um
a gênese do universo, corpos que se querem
e se desejam
Marcelo Leandro Ribeiro é escritor, poeta e letrista. Engenheiro nas horas vagas e palestrante nas noites pagas.
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Bianca Velloso
Suburbana
(Bianca Velloso)
mãe solteira
acorda cedo
prepara a marmita
enfrenta ônibus lotado
bate o ponto
pega pesado no batente
sustenta a cria
de vez em quando faz rimas
às vezes a vida é tão dura
que até esquece a poesia
chora, ri, sonha, desiste, insiste
e novamente chora, ri, sonha, resiste
existe
derrama versos
declama lágrimas
não foge da luta
briga quando é preciso
releva quando é possível
de vez em quando tem ódio
tem medos, segredos
não conhece o luxo
às vezes procura comida no lixo
mas quando sorri planta flores
nos olhos das pessoas e dos bichos
Contemporaneidade
(Bianca Velloso)
gosto da poesia
que brota
nos instantes
no tempo
no hoje
no momento
pouco importa
autoria
grande é a poesia
do poeta sem nome
grande é a poesia
que existe no peito
e no agora
O vendedor
(Bianca Velloso)
ele tinha os olhos
de brincadeira interrompida
oito anos no máximo
– moça, compra um saquinho de castanha?
sentou na areia e chorou
chorou um choro sem lágrimas
chorou um choro sem esperança
chorou a castanha que não vendeu
chorou o seu lugar na praia segregada
chorou os olhos covardes da moça
chorou o exílio da infância
chorou a doença do mundo
num choro sem lágrima e sem esperança
a moça dos olhos covardes também chorou
chorou a covardia dos seus olhos
chorou a inutilidade da cultura
chorou impotência do seu colo
chorou a segregação democrática
chorou a doença do mundo
e a vida seguiu sem lágrima, sem riso, sem nada
De repente aqueles olhos
(Bianca Velloso)
De repente aqueles olhos
aqueles olhos de repente
refletidos nos meus
aqueles olhos no meio do lixo
aqueles olhos farejando comida
aqueles olhos envergonhados
porque tocaram os meus
aqueles olhos no meio do lixo
aqueles olhos
eram de um homem
Bianca Velloso, natural de Porto Alegre, reside atualmente em Florianópolis, onde atua como optometrista. Poetisa respeitada nacionalmente, prepara o lançamento de diversos projetos.
