Poesias para sexta-feira
Consolo [Norma de Souza Lopes] a primavera está lá fora enlouquecida juntando as folhas quer pintar um milagre na parede…
Consolo
[Norma de Souza Lopes]
a primavera está lá fora
enlouquecida
juntando as folhas
quer pintar
um milagre na parede da sala
agora entendo
a primavera retorna
mesmo depois que eu partir
caiu uma nódoa da vida
na barra do vestido do poema
Insignificante
[Norma de Souza Lopes]
este poema tem um destinatário
no máximo dois ou três
é um poema portátil
erétil, volátil
destinado a pairar
entre os falantes da língua perdida
inaudível como voz de um velho cassete
ele não é nenhuma façanha poética
críticos poderiam dizer
que seus versos assim dispostos
serviriam a centenas de poemas
um poema não-convencional
imperdoável por sua falta de métrica e rima
exposto às intempéries
este poema poderia ceder
como uma corda estendida
não guarda mistérios dolorosos
envolvendo o sexo dos anjos
cada verso destina-se
a ocupar as cavidade entre as vértebras
sinta-o como um último clamor
perdoe seu excesso de diligência
à convocação para tornar-se humano
não incendeie a casa ainda
cuide dos homens da calçada fria
nunca pergunte onde deus está
não afaste seus pés da linha da fronteira
ignore o vício de achar sentido em tudo
Borboleta amarela
[Norma de Souza Lopes]
uma borboleta amarela lança-se sobre uma pedra
borboletas amarelas vivem apenas um dia
dentro das asas amarelas da borboleta
encontraram pedras
vinte anos é o tempo que demora
para uma borboleta amarela
virar pedra
borboletas amarelas prestam-se bem à fotografia
perto do fim
publicado em Entre Lagartos e Borboletas coletanea
Não é um poema de amor
[Norma de Souza Lopes]
quantos corpos ainda precisará
percorrer com teu braile sereno
para compreender que
ao final estará ainda mais só
na escuridão rubra de suas
pálpebras cerradas?
teu olhar solene me ofende
e a sombra de teu abraço
paira sobre mim como cicatriz
tivesse você alguma reverência
eu invocava o código de hamurabi
a fim de que me restituísse
o amor que te dedico
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