É segunda de manhã, e os acontecimentos têm preguiça de acontecer. Não se vê gato no muro, abelha no ar, futebol na rua, cavalo a galope. Mas o pior já passou: aquela clássica tristezinha que dá no domingo de noite.
Na segunda, a coisa só começa a pegar lá pelas oito e vinte. Mesmo assim, se tiver sol; quando chove ou faz frio, os lençóis e cobertas pesam, fixando na cama o pobre sujeito que tem compromissos. Fingimos despertar, mas na verdade vagamos pelo dia, operando por instrumentos.
Há poucos ônibus nas ruas e, portanto, os heróis que desafiam a preguiça têm que se espremer de pé. Quem conseguir um assento deve fixar os olhos nas páginas de um livro, fingir que é doido (balbuciando algo, como uma oração), ou que está dormindo. Qualquer coisa para não ceder o lugar a alguém, porque há limites para a simpatia numa segunda de manhã.
Era para o orvalho descer das folhas e deixar um pingo de diamante pendendo na borda, mas, tenham paciência, é segunda de manhã e os quilates não fazem sentido. Era para o diretor da empresa ser compreensível com o atraso do funcionário, mas, se domingo de tarde ele estava de mau humor com o vexame do seu time, imagine agora. Era para o café despertar, mas o tilintilim da colherinha na xícara dá ainda mais sono. Era para o repórter na rádio trazer a notícia, mas os fatos pediram mais vinte minutos ao despertador.
É segunda de manhã. Façam penitência, façam o favor, façam o possível. Apenas façam, até que a manhã passe e o mundo renasça.
Segunda de manhã é um bom dia para alguém da Caixa Econômica ligar, dizendo que você ganhou na loteria, ou que herdou uma fazenda em Muzambinho de um tio sumido. Mas também é um bom dia para elogiarem seu cabelo – o pouco já é lucro. As glórias de segunda de manhã são menos exigentes, e, por isso, preciosas.
Em compensação, jamais marque dentista, começo de reforma, colonoscopia ou aula de sânscrito numa segunda de manhã. Isso pode destruir a semana no nascedouro. Aliás, vamos parar com esse negócio de dizer que a semana começa no domingo. Não começa. Qualquer mortal sabe que a semana morre no domingo e renasce na segunda, quando, para qualquer atitude, será preciso um esforço sobre-humano.
Devia haver uma lei garantindo ao cidadão contribuinte alguma alegria na segunda: uma empadinha, um encontro, um eclipse inesperado, risadas de oito crianças, um dente que subitamente pare de doer.
É provável que você leia esta crônica em outro dia da semana. A segunda já terá passado, portanto, minha contribuição terá sido inútil. Até que a próxima semana venha, você a terá esquecido (crônicas são danadas pra gente esquecer) e sentirá no domingo de noite a mesma melancolia ao programar o despertador enquanto ouve, vinda da janela do vizinho, a bendita musiquinha que encerra o Fantástico.